“Glória! Ela está viva! Amém, Jesus!”
Os gritos de agradecimento foram proferidos por um dos policiais que arrombaram a porta de uma casa desabitada no Jardim Santa Clara, usada nos últimos dois dias como cativeiro de uma idosa de 84 anos de idade.
Chegava ao fim o primeiro sequestro registrado pela polícia de Assis no século XXI. O último registro desse tipo de crime na cidade aconteceu no final dos anos 90 do século XX.
“Sabíamos que ela não seria morta pelos sequestradores, mas temíamos que ela não pudesse resistir às baixas temperaturas da madrugada”, confidenciou o delegado seccional Newton de Calazans Junior a um grupo de jornalistas logo após a vítima ser libertada.
Para ter a convicção de que a vítima não seria morta pelos sequestradores o delegado se baseou na experiência de policiais do Grupo Anti-Sequestro da capital. “Somos velhos de polícia, mas temos que ter humildade para recorrer aos profissionais mais especializados em conduzir cada tipo de crime”, contou Calazans.
Ele revelou ter passado horas pendurado ao telefone na quinta-feira pedindo orientação ao GAS para saber como a polícia deveria agir no caso de Assis.
Outro aspecto importante para o final feliz do primeiro sequestro foi a união de militares e civis. “Somos todos parceiros. Nossos adversários não usam fardas ou coletes. Nossos adversários, a serem combatidos, são os bandidos”, contou um policial militar que participou do momento em que a porta do cativeiro foi arrombada.
“Tenho 20 anos de polícia e nunca vivi uma emoção como essa. Quando arrombamos a porta e encontrei aquela senhora deitada num chão gelado, sem agasalhos, sem meias e com pés e mãos amarrados, a primeira coisa que fiz foi ver se ela estava viva. Em seguida, após desamarrá-la, retirei minha blusa e cobri seu corpo. Um outro policial agasalhou os pés da vítima, que estavam congelados”, contou.
“Ela estava consciente e pedia água”, contou.
No momento em que a vítima foi encontrada, após vários locais suspeitos terem sido arrombados, os termômetros marcavam em torno de 8º, mas a sensação térmica era de 2º, em decorrência dos ventos que sopravam na cidade.
“Nesses dias e, principalmente, nas últimas horas, não tinha diferença entre militar ou civil. Eu, policial militar, andei em viaturas da Civil e teve investigador andando em carros da PM. Todos juntos e misturados”, brincou, comemorando o fim da operação, com a prisão de cinco pessoas.
Assim que a vítima foi encontrada, alguns policiais chegaram a pensar em acionar o SAMU, mas prevaleceu a sugestão dos que entendiam ser necessário transportar a vítima numa viatura comum para que ela recebesse o atendimento médico o mais rápido possível.
O jornalista Roberto Silo, do Diário de Assis, acostumado a acompanhar ocorrências policiais ao longo dos 50 anos de profissão, ouviu um dos delegados, que não escondeu sua revolta com as condições da vítima. “Eles (bandidos) deixaram esta senhora em condições desumanas, pois nem um animal a gente expõe a um frio deste, sem sequer um pano para se deitar”, descreveu o jornalista.
Uma viatura policial e dois carros descaracterizados da PM seguiram, em comboio, até o Pronto Socorro Referenciado do Hospital Regional. O barulho das sirenes acionadas serviam para abrir caminho no trânsito, mas soavam como gritos de comemoração dos policiais pela libertação da vítima.
PRISÕES – Obviamente que nenhum dos policiais dá detalhes, mas o serviço de inteligência e a troca de informações entre militares e civis, além de orientações passadas pelo Grupo Anti-Sequestro transmitidas ao delegado seccional, foram fundamentais para a prisão de cinco participantes do crime.
Em viaturas diferentes, num verdadeiro comboio, os sequestradores chegaram à Central de Polícia Judiciária exatamente às 12h19 minutos da sexta-feira, dia 8 de junho.
Repórteres de rádio, TV e jornalistas estavam estrategicamente posicionados tentando conseguir as melhores imagens.
Só um dos sequestradores parecia não se incomodar com a presença da imprensa. Cabeça erguida, bem vestido, ele desceu da viatura dizendo: “Podem me fotografar. Eu não tenho nada a esconder”.
Os demais sequestradores precisaram contar com a ‘ajuda’ dos policiais para serem fotografados ou filmados. Segurados pelos cabelos, eles eram obrigados a levantar a cabeça para mostrar o rosto.
“Separa! Separa eles”, ordenou o delegado Ricardo Nascimento, orientando os policiais a posicionarem os sequestradores em pontos isolados no pátio da delegacia.
Era nítido o olhar de comemoração estampado na cara de cada policial.
“O crime está esclarecido. Temos a refém libertada com vida sem pagamento de resgate e os sequestradores presos”, resumiu o delegado Marcel Ito Okuma.
Juntos, autoridades da Polícia Civil e Militar concederam uma entrevista coletiva para anunciar o fim do caso.
A partir de então, escrivães se debruçariam, durante horas, para ouvir depoimentos, anexar provas e documentos que seriam encaminhados à Justiça junto com a prisão preventiva de todos os envolvidos.
Duas armas, joias, telefones celulares e até pneus de um veículo foram apreendidos nas intervenções dos policiais.
O CRIME – O primeiro sequestro registrado em Assis no século XXI foi comunicado à polícia na madrugada de quinta-feira, dia 7, quando um rapaz procurou a PM denunciando ter sido sequestrado junto com sua mãe, nas proximidades do Mercado Modelo, quando retornavam para a casa após terem saído do Clube Kaikan.
Eles foram abordados no veículo Honda Civic por dois homens armados.
O rapaz foi colocado no porta-malas e sua mãe, uma idosa de 84 anos, no banco traseiro do veículo, sob ameaça e na mira do revólver de um dos assaltantes.
Por volta das 5 horas da manhã, no prolongamento da avenida Davi Passarinho, próximo ao antigo Frigorífico Cabral, o rapaz foi solto com a condição de arrumar dinheiro do resgate para ter sua mãe de volta, com vida.
Começava ali o crime de sequestro com cárcere privado que durou cerca de 28 horas.
Contrariando a determinação dos bandidos, o filho decidiu procurar a polícia, que pedia à imprensa para não divulgar o crime.
O pedido foi em vão.
A maioria dos órgãos de imprensa divulgou o fato.
O contatos dos bandidos com a família da vítima era feito por cartas entregues por um mototaxista.
Os policiais, em momento algum, se posicionaram ou passarem perto da casa da vítima. Essa foi uma das orientações do Grupo Anti-Sequestro transmitidas ao delegado seccional Newton de Calazans Junior.
A prisão do mototaxista que entregava as cartas e o interrogatório do homem considerado o ‘arquiteto’ do sequestro ajudaram a desvendar o crime.
ROUBO – Um experiente policial suspeita que a intenção do bando, inicialmente, não era praticar o sequestro. “Eles queriam roubar a família. Para mostrarem serviço no mundo do crime, além de conseguirem o dinheiro, imagino que eles pretendiam obrigar as vítimas a entrarem na residências, de onde roubariam objetos de valor e dinheiro. Algo fez eles com que eles mudassem de planos e passassem a exigir o pagamento de resgate para libertar a idosa”, prevê o policial.
Se deram mal.
Além de presos, a busca de informações para esclarecer o crime de sequestro fez com que policiais entrassem em vários locais suspeitos, onde, os supostos criminosos, assim como a sociedade, abominam o crime de sequestro, principalmente quando a vítima é mulher e idosa.
Policiais desamarram as mãos da vítima
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