Um homem de 41 anos de idade foi surpreendido pelas câmeras de monitoramento de um supermercado na avenida Dom Antônio, em Assis, furtando cerca de três quilos de carne e um suco de limão. Conduzido à Central de Polícia Judiciária, o autor alegou que estava “arrependido, com fome e sem condições financeiras para efetuar o pagamento dos produtos”. Com isso, o delegado, após longa fundamentação, decidiu não registrar a prisão em flagrante.
A ocorrência foi registrada por volta das 20 horas desta quinta-feira, dia 4 de janeiro.
O segurança do supermercado informou ter ‘detido’ o homem tentando fugir com gêneros alimentícios. Ele estava em posse de três peças de carne, sendo: 1,050 quilo de patinho, 788 gramas de alcatra e 628 gramas de fraldinha, além de um suco de limão. O valor total do prejuízo do supermercado seria R$ 94,71.
A Polícia Militar escoltou as partes até a Delegacia, mas informou “nada ter presenciado e não ter tomado partido no caso como condutor ou testemunha”.
Os policiais não se identificaram e nem foram apresentadas outras testemunhas.
O vigilante foi ouvido pelo delegado Giovani Bertinatti. Ele apresentou, com detalhes, os fatos e disse que poderia entregar, posteriormente, as imagens das câmeras de vigilância que comprovam o furto.
O suspeito do furto, de 41 anos, interrogado pelo delegado, disse estar “muito arrependido” e informou ter agido “impulsionado pela fome e por necessidade financeira”.
Após longa fundamentação baseada na legislação, o delegado decidiu não registrar a prisão em flagrante do acusado, que responderá pelo crime de furto em liberdade.
“Muito embora existente o requisito temporal referente ao flagrante impróprio, o conteúdo probatório está mais tendente à inexistência de crime em sentido analítico, em especial no tocante à tipicidade material (violação ao bem jurídico tutelado)”, iniciou o delegado.
“Há aparente incidência do chamado princípio da insignificância ou princípio da bagatela, na
medida em que os valores dos objetos subtraídos são de pequeno valor, R$ 94,71, muito inferior ao salário mínimo e de todo irrelevante quando comparado com o poder aquisitivo de um supermercado de grande porte, sendo imperioso, ainda, se considerar que o péssimo momento socioeconômico em que a sociedade brasileira se vê afligida tenha igualmente contribuído para a prática do fato típico, o que não vem a afastar mas ao menos diminuir a culpabilidade
da autoria (princípio da coculpabilidade, Zaffaroni); de mais a mais, os bens subtraídos são de gênero alimentício e o suspeito apontou ter praticado a ação motivado por fome, instituto humano dos mais incontroláveis que poderia inclusive vir a justificar a ação ante o aparente estado de necessidade, excludente de ilicitude; assim sendo, entendo por presentes os requisitos da mínima ofensividade da conduta, ausência de reprovabilidade social, reduzido grau de
reprovabilidade do comportamento e inexpressiva lesão ao bem jurídico tutelado imprescindíveis à excludente de tipicidade material relativa à insignificância, havendo ainda aparente excludente de ilicitude”, continuou Bertinatti.
Por fim, concluiu o delegado: “Assim sendo, na esteira do entendimento consolidado pela Súmula n. 6 do 1º Seminário Integrado de Polícia Judiciária da União e da Polícia Civil do Estado de São Paulo, delibero pela não autuação do investigado apresentado pelas razões supra e, a fim de cientificar e respeitar eventual discordância técnica e jurídica por parte do Ministério Público ou Poder Judiciário, respeitando-se eventual entendimento diverso do Delegado de Polícia Titular que venha a pegar receber e despachar o presente boletim de ocorrência entendo por
necessária a instauração de inquérito policial a fim de não prejudicar a eventual continuidade da persecução penal, caso haja discordância dos demais atores da persecução penal”, finalizou.